(publicado no Jornal do Commercio de 02.03.2010)
Roberto Leandro*
A notícia da semana no Recife é o projeto de transformação da área do Hospital Psiquiárico Ulysses Pernambucano (Tamarineira) em um complexo cujo centro vai ser um novo Shopping Center, o que vem deixando inconformados boa parte dos moradores dos bairros próximos da região. Uma análise mais profunda do caso demonstra que mesmo que os empreendedores do projeto consigam cumprir a promessa de preservar 70% da vegetação no local (o que pode ser considerado quase inverossímel), a situação configura-se um verdadeiro absurdo e um caso de omissão do poder público em relação a uma das poucas áreas verdes de um muncípio já tão saturado de concreto como o Recife.
A Constituição Federal em seu artigo 5º, incisos XXVIII e XXIV, garante a União, estados e municípios a prerrogativa de desapropriar propriedades privadas por utilidade pública ou interesse social (garantindo justa indenização ao proprietário). Então porque nenhuma das esferas estatais se movimenta efetivamente para transformar aquela área (hoje pertencente à Santa Casa de Misericórdia) em parque público?
Os cerca de 180 pacientes internos do hospital poderão ser transferidos, pela Santa Casa ou Secretaria de Saúde, para outro local onde até podem receber um melhor tratamento (o que já deveria ter ocorrido, independentemente do destino do terreno), mas qualquer pessoa de senso médio sabe que é impossível construir um Shopping Center naquela área sem destruir boa parte da cobertura verde existente. Deve-se lembrar ainda que um empreendimento desse porte causaria impactos ambientais nos arredores também. Como ficaria o já saturado trânsito de veículos das avenidas Rosa e Silva e Norte? Mesmo que a entrada do shopping seja feita na Cônego Barata, é bastante previsível o aumento do fluxo de carros nas vias próximas. E a poluição do ar e sonora produzida no entorno? Certamente, aumentará também.
Um planejamento urbano responsável deve direcionar e estimular grandes empreendimentos comerciais em áreas carentes disso (o que não é o caso da Tamarineira) e, mesmo assim, de forma adequada e cuidadosa, minimizando os impactos ambientais e os compensando com ações como a melhoria do transporte público no local, por exemplo.
Portanto, é obrigação do poder público tomar para si o terreno da Tamarineira, não apenas para preservar o meio ambiente, mas também para criar mais uma área de socialização na cidade. Em vez disso, infelizmente permanece inerte ou limitando-se a dizer que não foi informado. Ou seja, eximindo-se de sua resposabildade em garantir sustentabilidade ambiental nas intervenções urbanas.
Contra essa omissão das esferas estatais (particularmente municipal e estadual), a única alternativa da população é seu poder de pressão através da mídia ou apelar diretamente aos órgãos responsáveis, Ministério Público ou parlamentares. Agora, nas próximas eleições e depois delas, é preciso colocar questões como essa no centro do debate político. A luta em defesa dos poucos espaços verdes e públicos de socialização como a Tamarineira (e outros que também são constantemente ameaçados por interesses econômicos míopes e imediatistas) não é apenas uma questão local e restrita. Na verdade, está plenamente sintonizada com a busca global da humanidade por um modo de vida sustentável.
*Roberto Leandro é ex-deputado estadual e membro da executiva do Partido Verde (PV) de Pernambuco.
terça-feira, 2 de março de 2010
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